sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

Texto de um Deputado...

Não sou nem um pco "politizada", mas recebi esse e-mail e não tem como não concordar com o Deputado Átila Nunes sobre o que houve em Petrópolis. O pior é saber que não é só lá, e que não é só isso.
Jamais pensei que publicaria um texto escrito por um político, mas esse eu achei que seria válido publicar aqui. Acho que antes de mais nada, isso prova que "visão política" não é saber quem é fulano ou ciclano que está no poder, e sim saber reconhecer ao nosso redor tudo o que acontece de certo e errado, aprender com os erros e repetir os acertos, sem ganhar nada além de uma conciência limpa e a certeza de estar ajudando ao próximo e a nós mesmos!
bjs
;O)


VOTO MALDITO

Átila Nunes*

Petrópolis é uma das vítimas do populismo infame e irresponsável. Populismo que engana e que mata. Populismo que promete quase literalmente lotes no céu, em troca de votos. Um populismo que transforma eleitores ingênuos em miseráveis desabrigados, com filhos e bens arrastados pelas águas. Um populismo cínico e cruel.

Essa que é uma das mais lindas cidades brasileiras, foi também vítima dessa prática política, o da troca de votos pelo estímulo às invasões de áreas públicas e particulares. Foi nos anos 80, auge do brizolismo, que multidões eram estimuladas a invadir terrenos que mais tarde, eram cinicamente denominados de bairros pelos mesmos políticos que apadrinhavam essas invasões. Arrastados pela conversa fácil e pela oportunidade de ter seu "cantinho", chefes de família e donas de casa eram convidados a invadir áreas, em troca da garantia de votos nas urnas para os candidatos que montavam o esquema de invasão.

Esses políticos, que estimulavam pessoalmente as invasões, ganharam realmente muitos votos. Iniciado o processo de ocupação urbana desenfreada, surgiu um outro tipo de escambo. Se antes trocavam votos pela oportunidade da invasão, se trocava votos pela garantia da não remoção, mesmo que fosse uma área de risco, mesmo que se tivesse a certeza de ao sinal da primeira chuva forte, gente inocente iria morrer.

O esquema de escambo eleitoral aprimorou-se com o tempo. Depois da primeira fase, a da invasão e distribuição de lotes sem qualquer infra-estrutura, e da segunda fase, a de se garantir que ninguém seria removido nas áreas de risco, mesmo se tendo a certeza de que a morte era iminente, veio a fase 3. A que garantiu mais "votinhos", já na segunda geração de moradores. Essa fase, mais sofisticada, foi representada pela colocação de alguns "pontinhos" de luz, uma "biquinha" de água e um "asfaltinho" para manter aquele latifúndio eleitoral. Dizem que se mede a estatura moral de um político pelos diminutivos que ele emprega: "vou pedir para botar uma biquinha d'água e jogar um asfaltinho para descolar uns votinhos". Deve ser por isso que muitos deles são conhecidos por diminutivos, como os sobrinhos de Pato Donald.

Como se sabe, a Lei da Gravidade não é federal, nem estadual, e muito menos municipal (embora um prefeito já tenha desejado revogá-la). Ela pertence à uma das ciências exatas, a Física. Não existe a menor possibilidade de dar certo comunidades que na verdade se transformaram num amontoado de construções sem arruamento, galerias pluviais e esgoto no alto de montanhas. E os moradores que hoje moram nas áreas invadidas nas encostas de Petrópolis, sob o patrocínio dos políticos populistas que nos governaram, continuam morrendo. Ontem. Hoje. E com certeza, amanhã.

A existência dessas comunidades nos morros é um fato. À exceção das construções em áreas de risco, a maioria esmagadora das casas precisa desesperadamente de infra-estrutura. Dizem que obras enterradas, que não aparecem como esgoto e galerias de águas pluviais não rendem votos, ao contrário do embelezamento de ruas e praças. Mas temos que fazer algo de sério em matéria de infra-estrutura, senão esses petropolitanos continuarão sendo vítimas da omissão. E quem arca com os custos dessa irresponsabilidade política? O cidadão que paga imposto, seja o mais humilde, seja o de classe média. Afinal, alguém tem que pagar. E é o contribuinte, é claro.

Passados todos esses anos, continuam sem as escrituras as casas construídas nos terrenos invadidos não só em Petrópolis, mas como em todo o Estado. A maioria das casas não tem um sistema de água e luz projetado, não têm ruas decentes, e os moradores tornaram-se reféns de escadarias e servidões, prestes a desabar a qualquer instante. Ao longo das décadas, em vez de se usar a autoridade do cargo para conter novas invasões, incentivou-se a política do paternalismo à base de esmolas governamentais, típica atitude do infame populismo que tanto mal fez – e faz – ao Brasil.

Depois da redemocratização, prefeitos e governadores deixaram de usar a autoridade de que o cargo lhes garante, acovardados diante da desordem urbana, diante das invasões desenfreadas que afrontam a lei. Deixaram de usar a autoridade por medo do enfrentamento aos grileiros que abusam da ingenuidade do invasor, e também pela oportunidade de garantir a popularidade nessas áreas. Pior: políticos recusam-se a tocar nesse assunto, considerado um tabu, mesmo sabendo que o silêncio vai resultar em mais mortes. Afinal, ninguém quer perder esses "votinhos"...

Testemunha ocular da tragédia em Petrópolis e ao acompanhar o resgate de crianças, vítimas dos desabamentos, levantei meus olhos para cima, atraído pelo barulho de um helicóptero do governo que registrava a tragédia bem lá de cima, bem longe do lamaçal no qual estávamos enterrados até os joelhos. Alguém comentou ao meu lado: "Puxa, que fatalidade!"

Fatalidade, neste caso, é sinônimo de cinismo. Cinismo que rima com populismo, cujo prato principal é o voto. Um voto maldito.

* Átila Nunes, deputado estadual.

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